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Crônicas de Szaksia – Capítulo 3

Arjen e Freya retornaram triunfais à cidade de Teraf. Os sorrisos nos rostos do cavaleiro com coração de ladrão e da sacerdotisa rebelde chegavam a estranhar as pessoas que os cruzavam. A quantia de 500.000 dudas deixaria Arjen na metade de seu caminho para seu castelo e para Freya seria o suficiente para festejar por longos anos. Um cavaleiro da guarda real do Império Azul, por exemplo, considerado um cargo de alto escalão da terra natal de Arjen, recebe 2.000 dudas por mês para defender a cúpula real de qualquer perigo, incluindo a possibilidade de morrer por sua pátria. Uma sacerdotisa do Império Roxo, apesar de suas regalias e acesso irrestrito a áreas proibidas no império, não recebe nada e ainda precisa viver em total celibato para com sua ordem. A garota refletiu se continuaria no mundo da ladroagem com seu comparsa, porém se em pouquíssimo tempo eles conseguiriam esta quantia absurda com apenas um artefato, o que diria de alguns anos de jornada. O sabor do mercado negro era doce e viciante, inebriante, como um fruto proibido. Bom, proibido já era mesmo.

O próximo passo da caçada era chegar até a Lotus Preta e vender o artefato, simples, como em todas as ações direcionadas por eles. Mantendo um processo simples, as ações da Lotus Preta eram rápidas e fáceis de organizar. Arjen procurou o mesmo contato que lhe vendera os documentos do governo.

– Ai, chegou uma pétala, das grandes. – Sussurou o cavaleiro ao contato.

Acompanhando-os ao subsolo de um bar com canecas voando e homens se estapeando, o contato apresentou Arjen à Jamal de Lasfim, um dos compradores da Lotus Preta, espalhados por cidades estratégicas. Como diria Freya, “o cara do dinheiro”.

– Garotos, sabem das “manhas” da nossa organização. Sem nomes, sem registros, sem ligações, o que aconteceu aqui fica aqui, se ligou? A grana que ganharem aqui deve ficar longe de oficiais, bancos do Império e essas baboseiras, se ligou? Senão eles te pegam, te torturam, é “preju” pra vocês. A gente dá um jeito, se ligou?

– Me liguei cara. A gente já tem negócios com a “organização” faz tempo. Agora vamos ver se a organização vai ter condições de bancar o nosso produto.

– Mostra ai moleque, papo reto.

Arjen mostrou a espada, que desenrolara do tecido que a escondia. O brilho intenso da espada estava apagado, mas ainda sim, o artefato estava lá.

– Seu contato me deu a informação quentinha da localização de nada menos que a espada Glacius, das lendas de Van der Ban. Este pedaço de história chegou às nossas mãos com muito custo, guardada por um dragão vermelho! Acredita? No nosso continente, um dragão vermelho escondido. Aqui está a prova, uma escama do dragão.

– Você tá de zueira né? – Jamal gargalhou. O contato acompanha o comprador. – Você acha que nossos “parças” venderiam um documento com a localização de uma espada desse calibre pra dois moleques? Essa espada é falsa. E essa história de dragão. Moleque, você sabe desde a escola que dragões selvagens é coisa do passado. Os dragões vivem nos reinos, se ligou? Cada dragão no seu quadrado. Vermelho com vermelho, azul com azul. Ai garotinha, como esse moleque passou pela escola?

– Eu também não sei, senhor Jamal de Lasfim, porém posso lhe garantir que enfrentamos um dragão vermelho, aqui em nosso reino, nas colinas subterrâneas de Zonia. Arjen, mostra pra ele o papel.

Arjen tirou da bolsa os documentos que comprara do contato da Lotus Preta e entregou os referentes à espada Glacius ao contato. O contato pegou uma monolupa e analisou o conteúdo do mesmo. Ele também pegou uma caderneta e consultou alguns registros, fazendo sinal de negativo para Jamal.

– Moleque, você pode fazer outras organizações de idiota, mas a Lotus Preta, aqui é a coisa é séria. O controle é rígido e nossos contatos estudam documento a documento antes de sair passando as coisas pro povo trazer. Esse documento de espada Glacius é falso. A espada é bem bonita, deve valer alguns dudas por ai, mas tem que ser muito doido pra vir aqui e falar que é a Glacius. Agora, se não tem nada pra mim, vaza.

– Senhor, deve haver algum engano.

Jamal levantou e apontou uma faca para o pescoço de Arjen. Ele entendeu a deixa para sair e cabisbaixo, subiu as escadas arrastado por Freya. Os dois sairam da cidade de Teraf e pararam para descansar na colina de Ingi, ao norte. O caminho foi feito em silêncio. Freya lamentou o salto monetário que esperançou com a venda de espada e Arjen não se conformou em ter sido passado para trás, como pensou, pela Lotus Preta, ele, um fiel mercenário ao mercado negro criado pela organização. O cavaleiro, segurando a espada em seu colo, observava a cidade no horizonte, e nela, seus 5.000 dudas perdidos, mais os 500.000 almejados.

– Nem brilhar essa porcaria brilhou… – Arjen jogou a espada no chão. – Meu dinheiro, meu tempo e quase minha cabeça por causa de um pedaço de ferro.

– Não se esqueça do meu tempo e minha cabeça também. Eu estava lá.

– Glacius. Só eu para acreditar nessas histórias de livros pra por criança pra dormir.

Arjen chutou a espada, que brilhou novamente. Dela, uma luz azul emanou e uma tempestade de neve despencou dos céus. Freya e Arjen se levantaram ligeiros e abraçados, tentaram se proteger da ventania. A espada se tornou uma fera titânica, com correntes envolvendo seus braços e dentes e unhas formados por estacas de gelo.

Crônicas de Szaksia - Capítulo 3 - O espírito da espada

– Está enganada pequena e frágil criatura. Eu sou Glacius, a verdadeira forma da espada.

– Eita Freya, acho que eu tomei chá de cogumelo galáctico marinho. – Grita Arjen, ao se deparar com a fera gigante.

– Eu nunca tomei essas coisas e estou vendo o mesmo que você está vendo.

– Humanos que me libertaram da prisão criada pelos dragões. Esperei por retornar a superfície desde que fomos enganados por estas criaturas manipuladoras. Serei eternamente grato por sua ajuda, mas urjo em solicita-la mais uma vez para que me auxiliem a impedir um perigo eminente.

– Nós? Cara, você é tipo, Glacius, a espada lendária poderosa empunhada pelos maiores conquistadores. De que vale a gente tem pra você? – Respondeu Arjen, tentando desviar a conversa com medo de ser esmagado pela mão do monstro cinco vezes maior que seu corpo.

– Nos tempos antigos, meu espirito foi aprisionado nesta arma por um dragão negro, que temia minha força para impedir estas criaturas vis de executarem sua conspiração. A maldição obriga que eu possua um vinculo com uma alma humana para surgir novamente e, somente empunhado por este humano, posso agir para proteger a humanidade.

– Puts… – Arjen olhou para Freya, que entendendo a situação, não sabia se ria ou se chorava. – Sério mesmo que eu caí numa fria? Tipo, escolhido?

– Humano, serei tua força e será meu guia. Um mal antigo foi acordado, ainda mais perverso que a manipulação dos dragões. Precisamos encontrar os gigantes de Ladakourdbiadvansperui.

– Lada o quê? Deve ser alguma pegadinha da Lotus Preta. Freya, me diz que eu tomei o chá…

Inconformado com o fio que tropeçara na rede do destino, Arjen sentou com as mãos no rosto e Freya colocou sua mão no ombro do cavaleiro. Ele, que só queria dinheiro, e ela, uma grande aventura, além de dinheiro, se puseram atentos ao alerta do gigante.

 

…continua

Leia os demais capítulos aqui: https://kairasensui.wordpress.com/cronicas-de-szaksia/

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